Geração Nobel
Andei perguntando para amigos: “Por que o Brasil não tem um prêmio Nobel?”. É difícil chegar a uma conclusão racional e efetiva. Há muitos ângulos a serem analisados. Peter Drucker, considerado o pai da administração moderna, disse que mais importante do que as respostas são as perguntas. Pois percebi que a pergunta acima, com foco no que deixamos de fazer como país, não induz a qualquer ação. Então decidi mudar a pergunta: “Como criar uma geração Nobel em nosso país?”.
Recentemente o escritor e roteirista Antônio Prata colocou a reflexão em números. Prepare-se para a sensação de constrangimento. A Albânia tem 3 milhões de habitantes e 2 prêmios Nobel. A Suécia, com 10 milhões, tem 31. Argentina: 45 milhões, 4. Irlanda, 5 milhões, 8. O Brasil tem 213 milhões de habitantes e nenhum Nobel. Fosse uma Copa do Mundo, teríamos perdido de lavada para todas essas seleções.
Mas vamos continuar mais um pouco com a imagem do futebol. O Brasil tem cinco títulos mundiais. Nenhum outro país tem tantas conquistas. A Alemanha e a Itália, empatados em segundo lugar, têm quatro cada. O que explica o nosso sucesso nessa área? A resposta está na mais básica aritmética, e tem a ver com quantidade. Eu nasci em favela e sei que o sonho da maioria dos moleques – por muito tempo, hoje menos – foi ser jogador de futebol. Ora, se há milhões de crianças e adolescentes jogando na rua e treinando duro nos campos de várzea, é provável que a cada milhão de atletas surja pelo menos um supercraque.
O mesmo se aplica a outras áreas. Ou seja, precisamos aumentar exponencialmente nossos “candidatos” a Nobel. Uma geração pretendente ao Nobel pode ajudar o Brasil a ir para outro patamar nos índices de desenvolvimento social, na proteção do nosso patrimônio ambiental, na equidade racial, na educação universalizada e de qualidade. Um pretendente a Nobel faz um bem gigante ao país. Temos uma lista fabulosa de brasileiros indicados: Barão do Rio Branco, Carlos Chagas, Jorge Amado, Carlos Drummond de Andrade, dom Helder Câmara, Clarice Lispector, Chico Xavier, Irmã Dulce, Betinho, Marechal Rondon – este indicado por Franklin Roosevelt, presidente dos EUA, e endossado por ninguém menos do que Albert Einstein. A briga é dura. No ano em que Betinho foi indicado, 1994, os vencedores foram os políticos israelenses Yitzhak Rabin e Shimon Peres. Em 1988, ano da indicação da Irmã Dulce, a vencedora foi a ONU.
Já houve 121 edições do Prêmio Nobel e apenas 31 indicações de brasileiros. É como se tivéssemos um indicado a cada quase quatro anos. Precisamos ampliar o número de candidatos. Para tanto, temos que estimular a nova geração, construindo oportunidades de qualidade – da infância à vida adulta. Estamos muito atrasados. Pesquisa da Branding Brasil apontou que 55% dos brasileiros entre 16 a 20 anos morariam em outro país se pudessem.
Se algum brasileiro vencer o Nobel, muitos outros virão atrás, porque vai se expandir a consciência do que é possível fazer. É como dizia Ronald Reagan, ex-presidente dos EUA: “Se não nós, quem? Se não agora, quando?” Quero fazer parte de uma geração Nobel. Um dia o Ronaldo Fenômeno quis a Bola de Ouro. Muitos se recordam que ele venceu três vezes, mas poucos talvez se lembrem que ele não passou na última peneira do Flamengo porque faltou ao último teste por não ter dinheiro para a condução. Às vezes, um futuro craque ou Prêmio Nobel depende de um passe – um passe metafórico que só a sociedade, unida e solidária, pode conceder.
*Coluna publicada pelo Jornal O Globo em 27/09/2022