Desemprego Favela 3D Fome pobreza

Strike na pobreza

Diz a sabedoria popular que o bolso é a região mais sensível do corpo humano. Quando ele esvazia, experimentamos imediatamente a perda da autoestima, o medo do futuro, a fome. A ausência de uma fonte de renda é um nervo exposto.

Claro que inclusão social não se faz apenas pela renda. A noção de cidadania engloba as esferas da saúde, educação, lazer, moradia e do combate ao racismo e à desigualdade de gênero. Sem isso tudo, formamos meros consumidores, não cidadãos.

Mas a renda é o primeiro passo para a inclusão social. Pense num jogo de boliche: a bola lançada na pista não pode derrubar cada pino individualmente, mas, ao acertar o pino certo, provoca uma reação em cadeia. O mesmo vale para a falta de renda. Ela é o pino no qual devemos mirar nossas políticas sociais se quisermos realizar um strike na pobreza.

Por isso o programa Favela 3D, para além da construção de moradias e das ações de reurbanização dos territórios, tem a meta de zerar o desemprego nas comunidades em que está sendo implantado.

Dados concretos amparam essa preocupação: enquanto o desemprego no Brasil está em elevados 12%, nas favelas ele chega a mais de 50%. Uma redução drástica nesse número ajuda a quebrar a lógica da desigualdade, pois coloca a favela como referência em melhoria de indicadores sociais.

Voluntariado em SP - Gerando Falcões

Uma mudança desse porte exige ações em várias frentes. Na favela Marte, em São José do Rio Preto (SP), e na Sonhos, em Ferraz de Vasconcelos (SP), ambas pioneiras do programa Favela 3D, construímos verdadeiras fábricas de formação profissional, conectadas tanto aos interesses e vocações da população local quanto às necessidades econômicas de cada região.

Promovemos a capacitação técnica em áreas como vendas, logística, elétrica, alimentação, informática. Em poucos meses, vimos florescer startups, cooperativas de costura, hortas comunitárias e projetos de coleta de recicláveis. Os empresários da região, por sua vez, firmaram o compromisso público de priorizar a contratação de mão-de-obra da favela, contribuindo para alcançarmos o pleno emprego.

Os resultados são impressionantes. Já conseguimos bater mais de 40% da nossa meta. Nesse ritmo, pretendemos zerar o desemprego naqueles territórios até o final deste ano.

Isso muda completamente o clima da favela. O morador que vê seus vizinhos conseguindo um emprego sabe que ele pode ser o próximo. Essa percepção concreta de que a vida está melhorando funciona como uma injeção de autoestima na comunidade. Com renda, a favela volta a sonhar.

Renda é sinônimo de autonomia. Ela permite que o morador da favela se liberte da prisão de segurança máxima da pobreza, podendo, não raro pela primeira vez na vida, fazer escolhas conscientes e planejar seu futuro.

Quando alguém não sabe se conseguirá pagar o aluguel, comprar um medicamento ou mesmo garantir a próxima refeição para seus filhos, toda sua concentração se volta para as demandas imediatas. Quem tem fome não consegue traçar planos de médio e longo prazo. Consequentemente, não cria condições para um dia sair da pobreza.

Uma fonte de renda quebra esse círculo vicioso. Logo, investir na inclusão produtiva da favela não melhora apenas suas condições de vida hoje, mas garante que as gerações futuras viverão em um país mais justo e igualitário.

 

*Coluna publicada pelo Jornal O Globo em 08/06/2022

Comentários