Nossas cidades foram construídas num fundamento de desigualdade e iniquidade. Não se consegue oferecer oportunidades reais para a população mais pobre, o que gera um ciclo corrosivo de miséria e violência, uma sensação de estarmos enxugando gelo.
Como resolver? Não tenho respostas prontas, mas faço perguntas e tento aprender. Na semana passada, embarquei para Medellín, na Colômbia, para uma imersão técnica com meu time na Gerando Falcões. Lá fomos nós, Lemaestro, Nina Rentel, Lisania Pereira, Isabella Valente e eu.
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Cidade que já foi a mais violenta do mundo, com taxa de 400 homicídios por 100 mil habitantes, Medellín deu uma guinada, tornou-se exemplo global de inovação social. O que nos impressionou não foi tanto o que foi feito, mas como foi feito.
Não adianta ficar no meio do caminho. O Rio de Janeiro reproduziu a ideia dos teleféricos sobre a favela, mas não atentou para como foram implantados. Resultado: depois de todo o investimento, a infraestrutura de mobilidade urbana nos morros está desativada, aumentando a desconfiança da população em relação ao poder público.
O “como” tem a ver com a participação cidadã nos processos sociais, segundo Jorge Melguizo, ex-secretário de Desenvolvimento Social de Medellín. Não se trata de fazer para os pobres, mas a partir da escolha dos pobres. Embora muitas obras sejam realizadas em favelas, os aparelhos públicos construídos com frequência acabam esvaziados de público e sentido. Qual o erro? Ninguém pergunta aos moradores se aquilo era o que mais queriam e precisavam. Eles não são ouvidos, sua inteligência é subestimada. A experiência tem mostrado que, enquanto projetos saídos de pranchetas em escritórios com ar-condicionado tendem a fracassar, aqueles nascidos nas comunidades triunfam.
Em Medellín, a participação cidadã passa por construir a capacidade instalada no território, criar comitês temáticos, delegar incumbências e descentralizar decisões, como ocorre no orçamento participativo, em que a população define como o recurso público será investido no local. Cada comuna tem seu próprio plano de desenvolvimento social. Com voz ativa nas políticas públicas, ela se sente parte do processo, responsável pela manutenção, uso e proteção dos equipamentos. A participação cidadã não é apenas uma ferramenta social — é a essência da transformação. Sem ela, o que se tem é uma tosca e vã tentativa de tutela. Ninguém precisa de projetos decididos de cima para baixo, em que as inaugurações — para fins eleitorais ou eleitoreiros — são mais importantes que o impacto social de longo prazo.
Vencer a pobreza exige técnica apurada. É preciso conhecer a geografia física, social e humana do território. É preciso elaborar planos junto aos moradores e valorizar sua história. É preciso ouvir seu protesto. É preciso envolver toda a sociedade, da iniciativa privada à universidade. É preciso, por fim, criar laboratórios sociais, descontinuando o que não funciona.
Os pobres estão nas margens, seja na periferia das cidades, seja longe das oportunidades. Temos de colocá-los no centro da nossa escuta, do nosso investimento e das nossas decisões sociais.